(em conversa com o ChatGPT)
A macroeconomia apresenta-se como a ciência dos grandes números: o produto interno bruto, a inflação, o desemprego, a balança de pagamentos, o investimento agregado. O seu olhar dirige-se ao conjunto, não às partes; à sociedade, não ao indivíduo. É, por natureza, uma disciplina de abstracções colectivas, que procura compreender o comportamento da economia como um todo — uma espécie de organismo social dotado de vontade própria.
Esta abordagem, porém, carrega uma tensão filosófica profunda. Ao reduzir a realidade económica a agregados estatísticos, a macroeconomia transforma a multiplicidade das acções humanas num conjunto homogéneo e, por isso, inevitavelmente fictício. “A economia nacional poupa” ou “o Estado investe” são expressões convenientes, mas enganosas: não existem entidades que poupem ou invistam senão pessoas concretas, com preferências, expectativas e constrangimentos distintos. O agregado é um símbolo, não um ser real.
A viragem decisiva deu-se com John Maynard Keynes, que substituiu o enfoque clássico nas decisões individuais por uma visão global da procura e do emprego. Para Keynes, o Estado devia intervir para estabilizar o “nível de actividade” — um conceito puramente macroeconómico — através da política orçamental e monetária. A ciência do mercado transformou-se, assim, numa ciência da gestão do colectivo. Daí a crítica de Hayek e Mises: a macroeconomia, ao procurar governar o todo, esquece-se de que esse todo não é um sujeito, mas uma soma de interacções humanas descentralizadas.
A Escola Austríaca de Economia propõe o caminho inverso. Em vez de estudar agregados, parte da acção individual — do que Mises chamou praxeologia, a ciência da acção humana*. A economia, nesta perspectiva, não é um sistema mecânico, mas um processo de descobertas, de trocas e de erros, onde cada agente interpreta o mundo a partir da sua própria informação limitada. O mercado é, antes de tudo, uma ordem espontânea, e não uma máquina a ser calibrada por tecnocratas.
Enquanto a macroeconomia clássica aspira a medir e corrigir o todo, a microeconomia austríaca procura compreender como o todo emerge das partes. O seu método é individualista, não no sentido moral de exaltar o egoísmo, mas no sentido epistemológico de reconhecer que só o indivíduo age, escolhe e avalia. Sem esta base, qualquer teoria económica se converte num exercício estatístico desprovido de sentido humano.
Em última análise, a macroeconomia e a Escola Austríaca não são apenas duas metodologias distintas: são duas visões do mundo. A primeira vê a economia como uma entidade colectiva, susceptível de regulação central e optimização técnica; a segunda vê-a como um tecido de liberdades interdependentes, cujo equilíbrio resulta de milhões de decisões dispersas.
Entre o engenheiro social e o observador das acções humanas estende-se um abismo filosófico. É nesse abismo que se joga a fronteira entre a liberdade e o controlo, entre a economia como ciência do homem e a economia como ciência do Estado.
Artigo publicado originalmente no Portugal Contemporâneo.
