Os bancos centrais tornaram-se a força dominante nos mercados financeiros.
As decisões de flexibilização e de aperto movem todos os activos desde obrigações até ao capital privado. Supõe-se que o seu papel seja controlar a inflação, fornecer estabilidade de preços e garantir o funcionamento normal dos mercados. Contudo, há poucas provas de qualquer sucesso em atingir os seus objectivos. A era do domínio dos bancos centrais foi caracterizada por ciclos de expansão e contracção, crises financeiras, incentivos políticos para aumentar a despesa e a dívida do governo e inflação persistente. Recentemente, os bancos centrais das economias desenvolvidas assumiram um papel cada vez mais intervencionista.
A criação e proliferação de bancos centrais ao longo do último século prometeu uma maior estabilidade financeira. No entanto, como a história e os acontecimentos actuais mostram continuamente, os bancos centrais não impediram crises financeiras. A frequência e a gravidade dessas crises flutuaram mas não diminuíram desde que os bancos centrais se tornaram a figura dominante na regulação dos mercados financeiros e nas intervenções monetárias. Em vez disso, a actividade dos bancos centrais introduziu novas fragilidades e alterou a natureza, mas não a recorrência, da agitação financeira.
A evidência empírica desfaz o mito de que os bancos centrais puseram fim à era das crises financeiras frequentes. Independentemente da supervisão dos bancos centrais, um boom do crédito precedeu uma em cada três crises bancárias. Quem criou esses booms do crédito? Os bancos centrais, através da manipulação das taxas de juro. Segundo a base de dados abrangente de Laeven e Valencia, houve 147 crises bancárias apenas entre 1970 e 2011, numa era de domínio quase universal dos bancos centrais. As crises financeiras permanecem um fenómeno global persistente, ocorrendo em ciclos que coincidem com episódios de expansão do crédito. Os bancos centrais prolongaram frequentemente os períodos de expansão com taxas baixas e compras elevadas de activos e criaram momentos de colapso abrupto após erros de avaliação sobre a inflação e os riscos do crédito.
Segundo o trabalho de Reinhart e Rogoff, a taxa de crises não mudou de forma dramática com a existência dos bancos centrais. Em vez disso, as formas de crises evoluíram. Crises gémeas (bancárias e cambiais) continuam a ser comuns e a sua gravidade, medida em perda de produção ou custos fiscais, aumentou frequentemente, especialmente à medida que as instituições financeiras e os governos se entrelaçaram com as autoridades monetárias.
A Grande Crise Financeira de 2008, a crise da dívida soberana da Zona Euro e a vaga inflacionária de 2021–2022 situam-se entre os acontecimentos com os custos mais elevados da história, contrariando a visão de que os bancos centrais neutralizaram o risco ou a onerosidade das crises.
Os bancos centrais actuam como “credores de último recurso” e reguladores. Contudo, com cada crise subsequente, a solução é sempre a mesma: programas de compra de activos cada vez maiores e mais agressivos e taxas reais negativas. Isto significa que os bancos centrais passaram gradualmente de credores de último recurso a credores de primeiro recurso, um papel que amplificou as vulnerabilidades. Devido à globalização da banca central moderna e às inovações financeiras, as crises tendem a ser de maior escala e mais complexas, afectando a maioria das nações. O envolvimento profundo dos bancos centrais nos mercados significa que as suas políticas, como a liquidez de emergência ou as compras de activos, mascaram riscos sistémicos, conduzindo a falhanços adiados mas mais dramáticos.
Em muitas economias avançadas, vagas recentes de crises foram desencadeadas pelo acumular da dívida e pelas distorções de mercado geradas pelos bancos centrais, muitas vezes sob o pretexto de manter a estabilidade. O FMI e o Banco Mundial assinalam que cerca de metade dos episódios de acumulação de dívida nos mercados emergentes desde 1970 envolveram crises financeiras, e que os episódios associados a crises se caracterizam por maior crescimento da dívida, piores resultados económicos e reservas esgotadas — independentemente da banca central.
As principais crises das últimas décadas demonstraram que os bancos centrais não impedem a perturbação sistémica. Muitas vezes, as suas intervenções apenas adiaram o acerto de contas, mas pioraram os desequilíbrios subjacentes, particularmente a dívida pública. Os bancos centrais não impedem crises financeiras. Eles remodelam-nas, tornando frequentemente as suas consequências mais abrangentes, ao mesmo tempo que transferem os custos para o público através da inflação e da monetização da dívida.
A Prioridade Crescente: Apoiar o Governo em Vez de Gerir a Inflação
Como argumentei recentemente, os bancos centrais estão a dar prioridade crescente à distribuição da dívida pública em detrimento do combate à inflação. Os bancos centrais têm uma prioridade: manter viva a bolha da dívida pública. Injectam constantemente liquidez para estabilizar os emissores soberanos em vez de preservar a estabilidade dos preços. Só em 2025, os vencimentos globais da dívida vão atingir quase 2,78 biliões de dólares, e espera-se que os bancos centrais continuem a suavizar as políticas monetárias, mesmo quando a inflação se mostra persistente.
Os bancos centrais usam o seu enorme poder para disfarçar a insolvência dos emissores soberanos e tornar a sua dívida mais cara, o que conduz a subsequentes excessos de risco e à inflação dos preços dos activos. Além disso, a ideia de que taxas baixas e compras de activos são instrumentos que ajudam os governos a reduzir os seus desequilíbrios fiscais e a praticar prudência orçamental é desmentida pela realidade. Taxas artificialmente baixas e compras de activos justificam défices persistentes e dívida elevada.
Os bancos centrais estão a permitir inflação e instabilidade financeira quando deviam contê-las. Ao ignorar os agregados monetários e os riscos criados pela crescente intervenção do governo na economia e pela emissão de moeda através de instrumentos de dívida, os bancos centrais estão a permitir a lenta nacionalização da economia.
A errada expansão monetária dos bancos centrais e a política de taxas negativas em 2020, perpetuadas até 2022 apesar da inflação galopante, são um exemplo claro. Os governos beneficiaram no período de expansão com enormes compras de dívida que permitiram um aumento imprudente da despesa e da dívida do governo. Entretanto, os cidadãos e as pequenas empresas sofreram com a inflação elevada. Assim, quando os bancos centrais finalmente reconheceram o problema da inflação que ajudaram a criar, mantiveram políticas expansionistas priorizando a liquidez, o que alimentou ainda mais a irresponsabilidade governamental, e a subida de taxas prejudicou as finanças das famílias e das pequenas empresas que já tinham sofrido com a vaga inflacionária. Os governos não se preocuparam com a subida de taxas porque aumentaram os impostos.
A resposta da Reserva Federal ao aumento dos défices do governo favoreceu consistentemente maior intervenção governamental e níveis crescentes de dívida, mesmo à custa de maior inflação, o que minou a sua independência e credibilidade.
A independência desapareceu quando os bancos centrais abandonaram ou ignoraram a estabilidade de preços, culpando a inflação em várias absurdidades em vez da despesa do governo e do crescimento da massa monetária.
O Banco de Inglaterra, por exemplo, continua a cortar taxas e a suavizar a política com a inflação a subir.
Os bancos centrais tendem a suavizar a política monetária quando os governos aumentam a despesa e os impostos. Contudo, os decisores afirmam ser dependentes dos dados e rigorosos quando os governos reduzem impostos e despesa. Porquê? Os bancos centrais transitaram de autoridades monetárias independentes que salvaguardavam o poder de compra da moeda e controlavam a inflação para facilitadores da distribuição da dívida crescente do governo e ocultadores da insolvência crescente dos emissores.
A banca central moderna mostrou que nenhuma autoridade única deve fixar taxas de juro e liquidez. Erraram sistematicamente a favor do crescimento do tamanho do governo na economia e fizeram estimativas erradas da inflação e do crescimento do emprego. A razão disto é simples: à medida que o tamanho do governo na economia e a dívida soberana, frequentemente considerada o activo mais seguro, aumentam, o papel do banco central torna-se cada vez mais importante para manter a estabilidade do mercado.
Muitos bancos centrais afirmam que não interferem com a política orçamental e que permanecem independentes… excepto quando alguém ousa cortar impostos e despesa política. Assim, os bancos centrais não são um limite ao risco, ao aumento da despesa pública e à irresponsabilidade orçamental, mas sim um instrumento que permite excessos de mercado e do governo.
Artigo publicado originalmente no Mises Institute.