Uma das principais missões dos economistas é clarificarem com a luz da razão (e não da fantasia) fenómenos sociais que são alvo de desentendimento por parte do público e de deturpação por parte de grupos de interesses. Dado que o nível de impostos num país é determinado pelos governos e estes muitas vezes são dirigidos por engenheiros ou juristas, seria um conforto pensar que os primeiros-ministros seriam bem aconselhados em matéria de finanças públicas pelos especialistas em economia. Ora, isto em geral não acontece pois estes especialistas, frequentemente, são toldados na sua análise por “superiores interesses” ou simplesmente (o que se verifica muitas vezes) têm uma cultura limitada da ciência económica. Assistimos assim ao espectáculo de um economista famoso da nossa praça a argumentar o seguinte. «Alguém já viu o capital a produzir? Imaginem dois coelhos numa cova, de certeza que vão sair coelhinhos, mas se puserem duas notas de cem euros, imaginam que vão sair notas de vinte? O capital nada faz. Agora é tempo de devolverem a quem deu a sua vida ao trabalho» (ver aqui). Ora, esta falsificação da realidade (como é típico nos economistas marxistas) induz a um tipo de acção humana baseada numa fantasia – não vê que as notas não são capital por si (só o são na medida em que representam bens produtivos ou consumíveis) e também não vê que os coelhos para se reproduzirem precisam de comer, ou seja, precisam de capital. Por outro lado, os marxistas tendem a ver e a dar vida a coisas que não existem objectivamente, como a ideia de classe. A “classe dos trabalhadores” não é uma entidade, não tem existência nem pensamento autónomo. É apenas um nome colectivo. Erguer um pensamento na base da suposta luta de classes é (a)fundar-se no irreal.
Tal como outras falácias económicas que circulam à rédea solta, o tratamento dado aos impostos é muitas vezes deficiente. Procuro seguidamente traçar as consequências fundamentais resultantes da cobrança de impostos.
A essência de um imposto
A proposição fundamental no que toca à teoria dos Impostos devemo-la ao grande economista francês do início do séc. XIX, Jean-Baptiste Say, no capítulo “Natureza e Efeitos Gerais dos Consumos Públicos” do seu Tratado de Economia Política. Aqui, Say afirma o seguinte:
«Em quase todas as épocas, acreditava-se que os valores que a sociedade paga pelos serviços públicos retomariam a ela sob outras formas. E alguns imaginaram demonstrar este ponto dizendo: “O que o Governo ou seus agentes recebem, eles o restituem ao gastá-lo.” Ora, isto é um erro, e um erro cujas consequências foram lamentáveis, pois acarretaram gigantescas delapidações cometidas [pelo Estado] sem o menor remorso. Com efeito, os valores entregues pelo contribuinte são fornecidos gratuitamente ao Governo, que se serve deles para comprar determinado trabalho ou objecto de consumo. Ora, uma compra não é uma restituição».
Numa nota de rodapé, Say cita o exemplo dado pelo economista e matemático escocês Robert Hamilton no seu Ensaio sobre a Dívida Pública: Imaginemos um ladrão que chega a uma loja e assalta a caixa do comerciante, levando de lá todo o dinheiro, € 250, por exemplo; no dia seguinte, esse mesmo ladrão chega à mesma loja e prepara-se para comprar aí produtos num montante de €250, o montante que tinha roubado anteriormente. Perante a estupefacção do comerciante, o ladrão diz-lhe: “De que é que você se queixa? Não lhe estou a dar o dinheiro de volta? E além do mais, não é isto um estímulo para a sua indústria?”.
Ora, como é bom de ver, o comerciante, ao receber o dinheiro do assaltante na forma de uma venda ao mesmo, acabou por lhe ceder os produtos gratuitamente. No primeiro dia ficou sem €250, no segundo dia recebeu esses 250 e ficou sem a mercadoria; isto é equivalente a ser assaltado em géneros e não em dinheiro. Do mesmo modo, quando o estado taxa a indústria de papel em 1 milhão de euros e depois usa esse dinheiro para comprar papel para as repartições públicas, o que acontece é que esse milhão de euros é efectivamente dado ao estado e não vendido. A indústria é taxada em €1M, e depois recebe esse 1M pela venda do correspondente em papel – conclusão, fica com o mesmo dinheiro e menos 1M em papel (a preços de venda). O mesmo se passa com todas as outras indústrias a quem o estado compra bens ou serviços – o valor das vendas que não ultrapassa o valor dos impostos é de facto uma dádiva ao estado (ou uma extorsão, conforme o ponto de vista). Estas indústrias só não perdem o total de impostos que pagaram na medida em que venderem ao estado um valor superior ao montante que foi taxado.
Do mesmo modo, também é voz relativamente corrente que “os Alemães têm interesse em mandar para aqui fundos da União Europeia, porque depois recebem na mesma o dinheiro através das compras (importações) que lhes fazemos”. Reparem que esta “lógica” deduz que os alemães ganham em dar dinheiro cobrado através de impostos. Até uma criança de 6 anos sabe que não é assim. Quando os portugueses usam os fundos dados pela Alemanha para comprar BMW’s aos alemães, os alemães estão a receber o dinheiro que já deram previamente e a entregar BMW’s em troca. Conclusão: Entregaram os BMW’s à borla (vendo a Alemanha como um todo).
A mesma lógica aplica-se aos salários dos funcionários públicos. Estes salários não são “dados” aos funcionários, mas são antes a compra pelo trabalho prestado pelos mesmos. Portanto, de um modo simplista (elaboramos este ponto à frente com mais rigor) um imposto de €1000 significa menos um salário nas empresas e mais um salário na administração pública naquele valor. A questão é até onde pode ir o estado nesta destruição de empregos na economia concorrencial e criação alternativa de empregos no sector público.
Quem fica então a ganhar com os impostos?
Os impostos cobrados pelo estado podem ser usados em compras, como já vimos, ou em transferências directas para indivíduos ou empresas. Só neste último caso, em que o dinheiro é transferido sem contrapartidas é que certos indivíduos podem ficar a ganhar (mas só às vezes), a expensas de quem paga os impostos. Por exemplo, se o Estado cobrar €1M à empresa X em impostos e depois fizer uma transferência de €700 mil através de um programa de subsídios às empresas – como o QREN, por exemplo -, essa empresa pode ficar toda contente por ter recebido um subsídio de 700 mil mas, na verdade, em termos líquidos, ficou a perder 300 mil para o Estado. A esta perda de 300 mil, o Estado chama de “incentivos às empresas”. Do mesmo modo, um desempregado que esteja a receber um subsídio de desemprego mas que já descontou para a segurança social (através dele e da empresa, se for trabalhador assalariado) fica muitas vezes a perder já que receberia muito mais dinheiro se tivesse descontado aqueles valores para uma conta própria. Só a título de exemplo, note-se que o montante máximo de subsídio de desemprego que o estado português paga é de 1048 € (12 meses/ano) e nunca pode ser superior a 65% da remuneração líquida que o indivíduo recebia. Isto é, uma pessoa que tenha um ordenado de 3 mil euros é obrigada a descontar para a Segurança Social € 1042,5/mês, catorze meses/ano; se a pessoa estiver a descontar há 15 anos, isto equivale a 253 mil euros que a pessoa teria acumulado numa conta bancária que renda um juro anualizado de 2%. Se a pessoa estiver no subsídio de desemprego durante dois anos recebe um total de cerca de 25 mil euros, quando teria acumulado em contrapartida, naqueles 15 anos, 253 mil euros. Aliás, basta 3 anos de desconto, neste caso, para se acumular um total de €27.654. É portanto um excelente negócio para o estado e uma autêntica expropriação para o desempregado. Apesar de nem toda a gente auferir 3000/mês é fácil de ver que o suposto “subsídio” que muitas pessoas recebem é na verdade um “confisco”, quando as pessoas já têm certos anos de descontos. Assim, os descontos para a segurança social (SS) devem ser classificados como Impostos, já que não existe qualquer relação directa quantitativa entre os montantes descontados para a SS e o montante que as pessoas recebem como subsídio de desemprego ou pensões de reforma. Aliás, ao chamar-se a estas prestações, “prestações sociais” está-se a conotá-las com caridade e não com o justo retorno de quem descontou/poupou para as receber. Uma pessoa de 30 anos que esteja hoje a descontar para a SS não faz a mínima ideia do que vai ser a sua pensão de reforma ou subsídio de desemprego se for caso disso. Estes valores são decididos politicamente e de uma forma totalmente estranha ao que seriam aqueles valores se resultassem da sua capitalização numa conta bancária.
Portanto, os únicos que ficam a ganhar são aqueles que recebem transferências superiores aos impostos que pagam ou pessoas/empresas que vendem bens ou serviços ao estado em valores que nunca seriam justificados se fossem os cidadãos a decidir o que comprar. Vemos, assim, companhias de teatro a produzirem peças que ninguém vê mas que se sustentam na mesma através dos impostos subtraídos aos contribuintes; e empresas a produzirem “magalhães” que quase ninguém compraria já que é um luxo dar um computador portátil a um miúdo de 7 anos.
Efeito dos Impostos na Economia
Os impostos têm efeitos destrutivos na Economia e na Sociedade pelo menos através de quatro formas:
1.Um imposto como o IVA, o IRC ou qualquer outro que afecte as empresas representa um custo acrescido para estas empresas e logo uma descida da sua rendibilidade. Ora, é esta rendibilidade que dita os salários que as empresas podem pagar e os postos de trabalho que podem sustentar. Quanto maiores os impostos, maiores os custos para as empresas e menor a capacidade para pagar salários – o que implica uma destruição de postos de trabalho. Isto dita o fecho de empresas que já estão em actividade e a criação de menos empresas do que seria o caso se os impostos fossem mais baixos. Em particular, as empresas estrangeiras tendem a investir e criar postos de trabalho em países onde, entre outras coisas, o regime fiscal é mais favorável.
Que o IVA é pago pelo consumidor é outro mito. Se a empresa X vende um produto a 100 sem IVA e começar a entregar ao estado um imposto de 23% sobre o produto ela, em geral, não vai passar a vender o produto a 123. Isto porque, na medida em que houver bens substitutos (que é quase sempre o caso) as pessoas tendem a consumir menos desse bem para consumirem outros em alternativa ou, simplesmente, consomem menos um pouco de tudo. Assim, em geral, as empresas não passam o preço de 100 para 123 mas antes para um valor inferior àquele. Isto faz reduzir a rendibilidade das mesmas e concomitantemente a sua capacidade da pagar salários e criar empregos. Quando a taxa de IVA na restauração subiu para 23%, muitos restaurantes não subiram sequer os preços ou subiram pouco, isto porque os clientes têm sempre a alternativa de fazer as refeições em casa. Esta descida da rendibilidade na restauração fez inevitavelmente com que restaurantes que já estavam no limiar da rendibilidade mínima tivessem que fechar e despedir pessoal. Em relação ao desincentivo dos impostos, nomeadamente IRS, no que toca ao trabalho refiro o leitor para o ponto abaixo intitulado “os impostos e a moral”. 1
2. Quando o Estado cria postos de trabalho na administração pública ou instituição congénere desvia trabalhadores qualificados das empresas na medida em que lhes pagar um vencimento superior ao que recebiam nessas empresas. A questão é que as empresas pagam um preço (salário) de mercado, limitado pelo volume de actividade que têm; o estado paga um salário administrativo, decidido por ele. Assim, suponha que a empresa X paga 3000 mil euros ao Cesaltino que é um excelente chefe de equipa e já conhece o negócio há muito tempo. Aparece o estado e alicia o Cesaltino com um salário de €5000 mês para ir trabalhar para um observatório da administração pública. Ora, só na medida em que esse trabalho do Cesaltino no estado for de facto útil à sociedade é que esta ficou a ganhar alguma coisa com os impostos de 5000 que lhe paga. Caso contrário, a empresa X e a economia perderam um excelente quadro e ganharam mais um burocrata com funções de utilidade duvidosa. E o pior nem é que o Cesaltino deixe um cargo em que era muito produtivo para ocupar um outro que possa ser relativamente desnecessário. O pior é que muitas vezes o Cesaltino vai ocupar um cargo onde sistematicamente impõe entraves a pessoas e empresas. Tudo isto depende das regras e leis burocráticas e da boa vontade dos funcionários públicos – alguns estão lá para ajudar os cidadãos, outros para levantar problemas. Por exemplo, se o Cesaltino for para fiscal das finanças (em vez de ir para um observatório), o que acontece é que dantes trabalhava para dar dinheiro à empresa X e agora trabalha para tirar dinheiro à mesma empresa X. Isto leva-nos ao ponto seguinte.
Os nossos intelectuais de esquerda tendem a ver com bons olhos aquela mobilidade do privado para o público. Nesta era “pós-moderna” de “hiper-consumo” e “capitalismo selvagem” os gostos e os consumos tendem a homogeneizar-se e a nivelarem-se por baixo (dos seus altos padrões). Aparece assim o Estado como o salvador da cultura e das artes. Se não houvesse o financiamento do Estado às artes (através dos impostos cobrados aos contribuintes essencialmente filisteus) estas definhariam no lodaçal da vulgaridade. Em vez de sinfonias dodecafónicas, serialistas, “concretas”, etc., teríamos apenas a pimbalhada do Tony Carreira e Cª; em vez dos teatros existencialistas teríamos apenas revistas do la Feria; em vez dos filmes profundo-depressivos teríamos só filmes do Van Damme. O que nos vale é o Estado: por isso, lutaram acaloradamente estes intelectuais pela manutenção da RTP nas mãos do Estado; assim, segundo eles, defende-se a cultura. O pior é que a Antena 2 só passa, maioritariamente, música do Séc. 19 e anterior; a RTP1 dedica um domingo inteiro à noite para celebrar os 25 anos de carreira do Tony Carreira; a RTP2 não passa teatro, bailado, ópera e raramente um filme europeu. Ou seja, o próprio Estado não gosta da cultura subsidiada pelo Estado. Se quisermos ver filmes do Goddard, Bergman, Fellini ou Visconti temos que ir à FNAC comprar os DVD’s produzidos pela “maldita máquina capitalista.”
Em consequência desta arte subsídio-dependente tivemos um definhamento das artes em geral e da música erudita em particular. Antes do séc. XX a música de orquestra era para toda a gente – as pessoas assobiavam as óperas de Verdi e tocavam em casa sonatas do Mozart e do Beethoven. Hoje, a música contemporânea de orquestra é, em grande parte (não toda), uma aberração que praticamente ninguém gosta. Em muitos concertos de música contemporânea é difícil distinguir se a peça propriamente dita já começou ou se os músicos ainda estão a afinar os instrumentos. A música erudita, devido ao financiamento estatal, está completamente divorciada do público e os compositores compõe uns para os outros. Em resultado disto, a própria rádio estatal praticamente não passa música contemporânea pois os seus já escassos ouvintes não gostam dela, maioritariamente. Podemos aqui dizer, sem reservas, que o Estado tornou a música contemporânea um corpo moribundo. O grande guitarrista Cristopher Parkening diz que “actualmente, grande parte dos melhores compositores estão na indústria audiovisual, escrevendo complexas partituras sinfónicas para televisão e cinema” – isto é, a música que é paga pelos consumidores2. Apetece quase dizer:” graças a Deus que o Estado nunca financiou o Fernando Pessoa e o Herberto Hélder”3.
3. Os impostos servem para sustentar indústrias essencialmente nacionalizadas pelo Estado, como a educação e a saúde. Ora, estas indústrias são quasi-monopólios já que a concorrência privada não pode concorrer em pé de igualdade com o Estado quando este cobra preços bastante inferiores aos custos reais que enfrenta. O Estado cobre os seus custos de produção com impostos ao passo que as empresas privadas têm que os cobrir com receitas próprias que decorrem das suas vendas. O facto de aquelas actividades serem quasi-monopólios gera, como em todos os monopólios, um preço substancialmente superior ao preço que seria pago se houvesse pressão concorrencial. Assim, a sociedade é obrigada a sustentar um serviço nacional de saúde e de educação com um custo muito superior ao que teria de suportar se aqueles serviços fossem efectivamente concorrenciais. É preciso notar, e isto é muito importante, que os custos de uma instituição ou empresa não são algo perfeitamente objectivo. Uma empresa em concorrência tem um incentivo muito maior para racionalizar os custos do que uma empresa monopolista. Esta última pode dar-se ao luxo de pagar a três pessoas para fazerem o trabalho de um, mas a primeira, se o fizer, terá que reflectir isso nos preços e logo perder grande parte de quota de mercado. Os custos nos serviços do sector público tendem assim a ser maiores pois o Estado pode sempre cobri-los com impostos ou então vendê-los a preços obscenos quando os cidadãos não têm outra alternativa. Veja-se o caso do DUC (o documento único de circulação automóvel) – o Estado cobra por este papel cerca de 15 euros!!! Faz isso porque obriga todos o automóveis a terem este documento e os proprietários dos veículos precisam do documento para circular. Qual o limite para o preço do DUC? Se existisse concorrência, este preço seria limitado pela competitividade entre as empresas; quando o Estado é o monopolista deste serviço the sky is the limit.
A mesma lógica preside aos impostos irracionalmente altos sobre os combustíveis, tabaco (os impostos representam, nestes dois casos, a maior fatia na componente do preço), automóveis (o IVA cobrado sobre o imposto automóvel, que tanta gente fala e que não é digna de uma pessoa de bem, como o Estado devia ser, aplica-se a muitas outras coisas; veja-se as facturas da luz, além de combustíveis e impostos) e casa (IMI). O estado não cobra aqui impostos altos pelo consumo destes bens ser pernicioso para a saúde ou outra coisa qualquer. O estado cobra estes impostos celestiais porque as pessoas não têm praticamente alternativa – têm que circular e precisam de uma casa (a questão do tabaco é diferente mas facilmente perceptível também). O imposto sobre os combustíveis, que na gasolina representa bem mais de metade do preço por litro, em particular, são completamente irresponsáveis. Os combustíveis afectam consumidores, trabalhadores e empresas e são essenciais para o funcionamento da economia. Reconhecendo isto, o Estado português vai aumentar ainda mais este imposto em 2015, o que se reflectirá num aumento de 6,5 cêntimos por litro (ver Económico, 04/11/2014). O facto de chamarem a este novo aumento um “imposto verde” só pode ser brincadeira num país forrado a autoestradas e onde o consumo de gasóleo rodoviário e gasolina sem chumbo já tem diminuído todos os anos, desde 2004 (ver). Ainda há cerca de 2 meses iniciaram a construção de mais uma faixa rodoviária numa das três autoestradas que ligam Gaia ao Porto…O aumento também afecta as empresas de transporte público (ver) pelo que com “fiscalidade verde” o governo só pode estar a dizer que as pessoas devem começar a deslocar-se a pé ou de bicicleta (é esta a solidariedade estatal). Infelizmente, o exemplo não é dado por ministérios, autarquias e quejandos, onde os automóveis de alta cilindrada (os que consomem mais combustível) continuam a ser a prata da casa.
4. Os defensores da homogeneização dos rendimentos defendem taxas progressivas de IRS com o argumento de quem ganha mais deve contribuir mais. Mas esse já é o caso se a taxa de imposto for fixa. Para uma mesma taxa de 10%, um rendimento de 100 paga 10 e um rendimento de 1000 paga 100 – dez vezes mais rendimento e dez vezes mais imposto. Que mínima sustentação pode ter uma taxa progressiva? Esta taxa apenas faz reduzir o incentivo ao trabalho na medida em que um rendimento acrescido traz um valor líquido cada vez mais reduzido. Assim, se uma pessoa quiser trabalhar mais horas ou assumir outras funções mais bem remuneradas mas com mais responsabilidade, vê a compensação por esse sacrifício adicional cada vez mais reduzida. Por outro lado, na medida em que estes impostos servem para pagar verdadeiras “prestações sociais”, muitas pessoas decidem, racionalmente, não trabalhar e auferir um pouco menos, do que trabalhar para ganhar um pouco mais. Isto significa, mais uma vez, criação activa de desemprego por parte do Estado. É o equivalente a homogeneizar as notas dos alunos, independentemente do que cada um estuda. Tira-se 3 valores ao João, que teve 18, e dá-se-lhos ao Manuel, que teve 7, para este acabar o 12º ano. É bom de ver que a partir daqui o João não terá muito incentivo para tirar notas altas.
Menos impostos é igual a mais riqueza e mais emprego
Que a descida dos impostos, por si, cria prosperidade é um facto evidente como procurei demonstrar atrás. Contudo, há sempre aqueles que necessitam de verificação empírica mesmo daquilo que é evidente a priori. Menciono então um dos exemplos mais recentes de descida de impostos e do peso do Estado: em 2010, a taxa de desemprego na Letónia atingiu os 19,5% e o PIB estava com crescimento negativo. Para fazer face a esta calamidade o governo daquele país cortou a despesa pública de 44% para 36% do PIB, dispensou 30% dos funcionários públicos, fechou metade das agências públicas e reduziu os vencimentos dos funcionários públicos em 26% num só ano. Os vencimentos dos ministros foram reduzidos em 36% . Vejamos a comparação deste país com Portugal para o período 2010-2013 (dados da Eurostat):
Note-se como, após a introdução das medidas referidas a taxa de crescimento do PIB na Letónia subiu de -0,3% para 5,3% e em três anos a taxa de desemprego desceu de 19,5% para 11,9%. Em contrapartida, a realidade portuguesa é um desastre total.
Veja-se também como Portugal é o 2º país da EU-28 com maior dívida do sector público e a Letónia é o 5º menor.
Veja-se também a seguir como a Letónia é 3º país da EU-28 com menor despesa pública (% do PIB) e Portugal aparece em 18º.
A teoria e os dados indicam todos no mesmo sentido: a economia portuguesa está em declínio por vontade dos governos. Entre escolher continuar a manter um setor público desproporcionado ou baixar os impostos, os governos têm deliberadamente optado pela primeira escolha. O governo escolheu pobreza em nome da inércia e dos interesses instalados.
A ética no uso do dinheiro dos contribuintes
Este ponto complementa o anterior e é a constatação que, pelo menos neste país, o uso do dinheiro dos contribuintes tende a ser usado com pouco critério dando origem a grandes desperdícios que muitas vezes são encobertos pelos chamados custos de produção. Esta chaga afecta não só as empresas públicas mas também toda a restante estrutura do estado. A verdade é que não havendo uma disciplina de contenção de custos que só pode ser dada por um mercado concorrencial, a tendência é para gastar muito mais do que o que seria necessário – reflectindo-se isto em impostos mais elevados que alimentam uma estrutura que gera pouco retorno social ou económico em relação àquilo que custa. Este fenómeno do desperdício e da incúria na gestão dos dinheiros públicos tem a ver com o pathos cultural do país e não pode ser ignorado numa análise das suas finanças públicas. Assim, quando se argumenta, no sentido de desculpabilizar os impostos pela situação do país, que os países nórdicos têm uma carga fiscal igual ou superior à nossa e são países (relativamente) ricos está-se simplesmente a ignorar que a responsabilidade fiscal é diferente nos dois casos. “Responsabilidade fiscal” não é manter um défice baixo que continua a suportar uma despesa pública irresponsável através do constante aumento dos impostos para a sustentar. Responsabilidade fiscal é taxar apenas o que é absolutamente necessário e fazer um uso “religioso” dos impostos que foram cobrados coercivamente ao contribuinte. Assim, assistimos na Suécia a exemplos de verdadeira responsabilidade fiscal que são impensáveis em Portugal: ver aqui.
Neste país, por mais que se aumente impostos e todo o tipo de taxas e contribuições, o dinheiro nunca chega. Temos há várias décadas uma trajectória persistentemente crescente dos impostos e ao mesmo tempo uma dívida estatal cada vez maior. Por outras palavras, estamos a destruir as empresas e o bem-estar dos trabalhadores para alimentar um estado insaciável e com uma utilidade efectiva muito duvidosa. Ou seja, os prejuízos decorrentes dos impostos sobre o sector privado não são compensados nem de perto nem de longe pelos serviços prestados pelo estado. A este propósito a situação não é nova, claro: no livro mencionado no início deste artigo, J. B. Say cita um antigo ministro francês, Duque de Sully, que nas suas memórias dizia que, na França de 1598, por cada 150 milhões que eram cobrados aos contribuintes só 30 milhões entravam no tesouro real. “A coisa parecia inacreditável – dizia Sully – mas à força de muito trabalho, demonstrei ser verdade”. Substituam, no presente, “tesouro real” por “serviços prestados aos cidadãos” e temos a mesma coisa.
Mesmo assim, até as receitas fiscais têm limite
Sendo que não existe um limite legal para as receitas fiscais (taxas e impostos que o Estado cobra aos cidadãos) a tentação dos sucessivos governos tem sido sempre de aumentar aquelas receitas. Isto, entre outras coisas, permite “comprar” votos, como se diz na gíria. No fim de 2023, Portugal tinha 745 mil trabalhadores afetos ao estado (incluo aqui empresas públicas – ver abaixo). Se considerarmos a família de cada um destes trabalhadores vemos que o potencial eleitorado capaz de ficar satisfeito com despesa pública é enorme. Some-se a isto todo o tipo de transferências que o Estado faz para os cidadãos e empresas em geral4 e constata-se que a tentação para gastar é muito grande quando não existe responsabilidade fiscal por parte dos governantes (o termo “gestão danosa” parece não se aplicar ao governo). Mas será que o Estado pode obter sempre mais receita através da constante subida de impostos? A resposta é que, a partir de certo nível de impostos a receita começa a subir cada vez menos ou nada e no, limite, quando a destruição económica é já tão grande, começa mesmo a descer. Isto deve-se, directamente, a aumentos de preços que diminuem as vendas de tal forma que mesmo impostos mais altos diminuem a receita fiscal e, indirectamente, à destruição da economia citada anteriormente, que faz reduzir toda a base económica na qual incidem os impostos – menos empresas, menos emprego, etc.
Esta relação entre as receitas fiscais e o nível de taxação pode ser representada num gráfico a que se dá o nome de curva de Laffer (segundo o economista Arthur Laffer). A curva é apenas uma representação visual que pretende ilustrar, simplificadamente, a relação acima descrita.
Na realidade, como menciono abaixo, a receita fiscal responde de formas diferentes ao aumento de impostos consoante o tipo de produtos em causa. As mentes mais estatistas tendem a ver neste curva um guia para se maximizar a receita fiscal. É bom que se leia a legenda na figura que se segue.
Em Portugal, um país que tem uma despesa pública na ordem dos 50% do PIB, no ano de 2012 a diminuição da receita fiscal foi generalizada, «atingindo as receitas de impostos directos (menos 8,3%) como o IRS ou IRS, de impostos indirectos (-3,9%) como o IVA ou o IMI e as contribuições sociais (-6,2%). O INE diz que a diminuição da carga fiscal está associada à forte contracção da procura agregada e à diminuição da população empregada.» (ver DN, 17/05/2013). Observe-se que esta diminuição das receitas do IVA em 2012 aconteceu mesmo depois do aumento do IVA, em Outubro de 2011, de 6% para 23% na electricidade e no gás natural (ver): «as medidas tomadas não permitiram impedir a redução da receita de impostos, tanto em termos nominais como em percentagem do PIB”, referiu o INE.
Os Impostos e o Desemprego
Não existe desemprego por haver excesso de mão-de-obra – os custos elevadíssimos da mão-de-obra devida aos impostos é que geram desemprego. Dizer, aliás, que existe excesso de mão-de-obra é ridículo. Todos nós estaríamos dispostos a contratar alguém para nos fazer certos trabalhos se tivéssemos rendimentos para isso. E basta ver as condições em que estão certas infraestruturas para perceber que o que não falta é trabalho para fazer. Como dizia o Economista Ludwig von Mises, o trabalho é dos factores de produção mais escassos que há. O problema, além do custo, como referi, está, muitas vezes, na formação específica desse trabalho que nem sempre está em linha com as necessidades específicas da sociedade.
Agora, havendo esta discrepância entre a formação dos trabalhadores e a formação requerida pelas empresas e outros, pergunta-se: Quem é o principal responsável pela formação escolar neste país, que dita a política educacional em Portugal e praticamente nacionalizou a educação? Será de estranhar o paralelismo entre um estado que educa pessoas para o desemprego e um mesmo estado que absorve grande parte da força de trabalho do país? A história do Estado enquanto participante activo no mercado é uma história de desastre e é tempo das pessoas assumirem na sua cabeça o que já é evidente há muito tempo. A somar ao desastre da educação em Portugal surgiu há poucos anos mais uma agência estatal (Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior – A3ES) com a missão de orientar e fechar cursos superiores (incluindo os da universidades privadas). Portanto, em vez de serem as pessoas e as empresas (o mercado) a decidir que cursos querem criar e frequentar é o Estado que aparece a ditar as leis. Esta agência fecha cursos no ensino privado com base no curriculum de professores que, embora tenham capacidade e formação para leccionar nos cursos, não preenchem o requisito desta agência de publicar em certas revistas científicas (que ela na prática decide) artigos de utilidade mais do que duvidosa (na linha dos compositores contemporâneos, os professores escrevem a maioria dos “artigos científicos” uns para os outros). Temos assim cursos que fazem falta ao tecido empresarial do país mas que são fechados porque os docentes não publicam artigos nas revistas definidas pela agência que não têm, a maior parte das vezes (toda a gente sabe isto) qualquer utilidade para a função de docência. Não é também incomum (falo da área de Economia) que certos professores com um curriculum de publicações científicas extenssíssimo, tenha conhecimentos muito deficientes das realidades económicas concretas e dos próprios princípios básicos da ciência.
Alguns pareceres desta agência são do género “Fecho Imediato”. É óbvio que isto é maná para qualquer ditadorzinho em potência que circule nos corredores da agência. Por outro lado, exige-se habilitações (que pouca relevância têm para as funções que vão desempenhar) a alunos para entrar em certos cursos que estão em falta no país, o que na prática torna a mão-de-obra ainda mais escassa do que já é. Por exemplo, actualmente existe muita procura por trabalhadores com formação náutica e a única escola superior náutica em Portugal afirma que os seus alunos têm uma taxa de empregabilidade de quase 100%. Somado à falta de especialistas nesta área, o Estado exigiu, a partir de 2012, que os alunos fizessem um exame de ingresso de Matemática e Física para alguns dos cursos, o que fez descer o número de alunos que conseguissem entrar nos mesmos. As empresas portuguesas querem investir no mar, mas “os sábios” não deixam.
Os Impostos e a Moral
Levanta-se ainda questões morais associadas ao facto de o Estado poder taxar os seus cidadãos sem qualquer limite, como já referi antes. Neste momento, uma pessoa que pague 20% de IRS mensalmente, retido na fonte, recebe apenas à volta de 55% líquido em relação ao que a entidade patronal gasta consigo (incluindo segurança social). Acrescente-se a isto os impostos que o individuo ainda vai pagar sobre o seu rendimento líquido, como IVA, IS, IMI, IABA, ISP, IT, ISV, IUC, contribuição audiovisual e outras taxas para o Estado e aquele indivíduo, sem muito esforço, entrega ao estado à volta de 60% do montante que o seu patrão paga pelo seu salário (a situação é mais grave para rendimentos mais altos, pois têm uma taxa de IRS superior – neste caso, muitos cidadãos entregam para cima de 70% ao Estado).
Mas isto serve para pagar os serviços usufruídos pelos cidadãos, certo? Hmm…conto apenas um exemplo, de entre muitos: desde 2010 dezenas de municípios cortaram na iluminação pública. No concelho onde vivo (onde a iluminação pública já não era propriamente o ponto forte) foram cortadas luzes (candeeiro sim, candeeiro não) em todas as estradas e muita gente não vê a fechadura da porta para entrar em casa.
Outro facto flagrante no emprego criado pelo estado (entre muitas outras, deixo ao leitor a criação da lista passada e presente) é que aparentemente o sector público é o único que ainda faz greves em Portugal. A este propósito tomo a liberdade de citar um excerto do Professor Pedro Arroja num artigo publicado no semanário Vida Económica do passado dia 07/11/2014:
«Greves, em Portugal, hoje só se vêem no sector público… São greves de professores, de médicos, de magistrados, enfermeiros, dos transportes, do fisco, até das polícias. Greves de carpinteiros, trolhas, trabalhadores da construção civil, operários fabris ou de trabalhadores agrícolas, essas é que nunca mais se viram no país. Os grevistas hoje, em Portugal, são de categoria – pilotos, hospedeiras, professores, juízes, médicos – enfim, um luxo. Não apenas isso, o patrão é sempre o mesmo – o Estado […] Ganham francamente acima da média dos portugueses, têm privilégio atrás de privilégio – regimes de reforma e de saúde especiais, regimes de trabalho especiais, segurança de emprego, etc. – e o patrão nunca está por perto. Com o tempo, os sindicalistas da TAP e do sector público em geral, desenvolvem uma cultura de meninos mimados. Passam o tempo, na expressão popular, “a cuspir no prato que lhes dá de comer” enquanto reclamam mais privilégios, e quanto mais privilégios se lhes dá, mais eles exigem.»
Este estado de coisas tende a criar uma animosidade entre o funcionário público e o utente: o primeiro não tem incentivo para ser cordial ou prestável pois disso não depende o seu salário ou emprego; o segundo olha para o primeiro como sendo o tipo que recebe os seus impostos. Como esses impostos são coercivos o funcionário público é muitas vezes associado a um sentimento de indignação reprimida.
Os Funcionários públicos
Os funcionários públicos e demais população tendem a acreditar que o Estado é que lhes arranjou um emprego. Mas se estes funcionários não trabalhassem para o Estado trabalhariam para o sector Privado. Só a maior das más-vontades é que pode argumentar que estas pessoas não teriam simplesmente espaço no sector privado. Como já mostrei em cima, são precisamente os impostos – que servem, entre outras coisas, para pagar salários a funcionários públicos – os causadores de desemprego. A lógica é inescapável – à medida que o Estado vá reduzindo impostos vai criando empregos no sector privado que vão absorvendo os excedentários da função pública. Os funcionários públicos não ganham portanto nada em trabalhar para o estado, na medida em que estejam dispostos a trabalhar numa empresa privada.
O único fundamento legítimo para os impostos
A única lógica possível para haver impostos é estes servirem para financiar certas actividades que estarão, eventualmente, melhor nas mãos do estado e que são essenciais para a economia5. Embora esta questão seja alvo de opiniões discordantes entre os liberais, podemos conceber um papel construtivo (e não destrutivo) para o estado na Defesa Territorial, na Segurança, na Justiça e em certas obras públicas às quais é difícil atribuir direitos privados de propriedade como é o caso das estradas. Só na medida em que estes impostos sejam usados judiciosamente para estes fins e com total respeito pelo sacrifício dos contribuintes (e não para cobrir o país de autoestradas) é que podem ser justificados.
Esta visão do papel do estado tem como paralelo um gestor de condomínio. O Estado é então a entidade que está encarregue de fazer a manutenção das partes comuns do condomínio, assim como tomar conta da sua segurança e mediar conflitos entre os condóminos. Mas se os condóminos acham relativamente normal pagar um custo de condomínio de 50 ou 60 euros para um apartamento com prestação/renda de 500 euros, já acharão inconcebível pagar um valor de 250 euros. A diferença é que o condómino simplesmente se recusaria a pagar este valor e acharia até que era uma brincadeira de mau gosto; já o contribuinte tem que pagar quaisquer impostos ditados pelo Estado e estar calado. Se não o fizer, sujeita-se a ir preso.
De qualquer modo, e já que um imposto representa sempre uma violação do direito de propriedade do cidadão, o ideal é que estas actividades sejam financiadas de forma voluntária, como por exemplo, através do pagamento de taxas obrigatórias sobre transacções a crédito para quem quiser usufruir de certos serviços da justiça (estas taxas serviriam para financiar também as outras actividades); a exploração dos jogos tipo lotaria e euromilhões pelo estado; donativos voluntários de cidadãos. Estes são apenas alguns exemplos6.
O problema da Natalidade – “Este País não é para Velhos”?
Segundo os dados mais recentes do Population Reference Bureau, Portugal é, juntamente com a Itália, o país europeu com menor número de filhos por mulher (1,4) e um dos nove países com essa menor taxa de fertilidade no mundo inteiro. Em 1971 aquela taxa era de 3 filhos por mulher e estávamos em 154 no ranking mundial; em 2024 estamos no fundo, em 207º lugar.
Esta reduzidíssima natalidade acarreta, claro, aquilo a que se chama de dependência demográfica, no sentido de começar a existir uma população sénior cada vez maior em relação à população activa e um enorme problema na Segurança Social (SS) como a conhecemos agora. Embora as receitas da segurança social tenham aumentado cada vez mais nos últimos anos, a sua sustentação é cada vez mais precária – daí o aumento da idade de reforma e de redução das pensões a que temos vindo a assistir recentemente. Note-se que as receitas da SS em percentagem do PIB passaram de 10% em 2001 para 22% em 2012 (mais do dobro).
A baixa natalidade e o aumento da esperança média de vida fazem com que Portugal se esteja a tornar um país de velhos com as consequências sociais e económicas que isso acarreta – neste último aspecto temos uma base de incidência de descontos para a SS (população activa empregada) cada vez menor e uma faixa da população cada vez maior a necessitar daqueles descontos. Embora os problemas sociais que daqui advêm sejam óbvios, há que dizer que a questão económica da SS, conforme está, é insustentável, como é bom de ver. Isto só se resolve de duas formas: com a entrada de imigrantes em idade jovem, que contribuam para a SS, ou com o aumento da natalidade. As duas estão relacionadas com o crescimento económico – os emigrantes com qualificações só virão para cá se houver trabalho relativamente bem pago e as mulheres só começarão a ter mais filhos se tiverem condições económicas para isso. Como se resolve este último problema? A maior parte dos pais, hoje, só está disposto a ter mais filhos desde que continue a garantir o seu bem-estar e o dos filhos. Isto é, os rendimentos de um casal limitam o número de filhos que estão dispostos a ter (ao contrário de outros tempos, em que os filhos eram vistos como mais um trabalhador para a família). Segue da minha discussão anterior que a redução significativa de impostos (não apenas o IRS) leva a um aumento do rendimento disponível das famílias em geral e, daí, a uma propensão maior a terem filhos. Referi este ponto, na medida em que se trata de um problema iminente neste país, embora o único sistema justo de SS seja o regime de capitalização (onde a pessoa é dona das suas poupanças).
Conclusão
Os impostos só serão neutrais se o Estado taxar A em 100 e transferir-lhe os mesmos 100 sem condições. E mesmo aqui não seriam totalmente neutrais pois podem tirar os 100 quando A precisa deles no momento e não mais tarde. De resto, os impostos representam sempre um desvio de propriedade de certos agentes para outros. Na medida em que os impostos diminuem ou eliminam a rendibilidade do sector privado contribuem activamente para a redução do emprego nesse sector. Por outro lado, contribuem para a criação de emprego mantido directamente pelo estado. Como o sector estatal não obedece, primeiramente, a uma lógica de racionalidade económica, o que assistimos é a uma redução da produção no sector privado acompanhada por uma criação de produção muito deficiente no sector público. Os impostos têm assim um efeito líquido negativo para a produção total de um país e como tal contribuem para o seu empobrecimento. O facto de a burocracia do Estado também não depender directamente da performance económica do país faz com que aja muitas vezes com desinteresse ou até hostilidade para pessoas e empresas, somando-se assim ao fardo já pesado dos impostos uma máquina burocrática que ainda dificulta mais a actividade económica.
Estamos portanto na era democrática do “Hiper-Estado” e “Socialismo Selvagem”. A questão à volta dos impostos tem o seu cerne no respeito pela propriedade individual. Um imposto é, por definição, uma subtracção coerciva da propriedade de um indivíduo. Só é possível termos o Estado que temos porque as pessoas lhe dão assento explícito ou implícito. Claramente, as pessoas que desculpam ou defendem impostos altos não têm o direito de propriedade em grande consideração. A única coisa que se pede aos que pensam assim é que sejam consistentes e tenham a sua propriedade no mesmo apreço que a dos outros. Que defesa estas pessoas podem fazer da sua propriedade (que tanto estimam) quando não defendem (efectivamente) o direito à propriedade dos outros?
Referências:
- A capacidade dos vendedores passarem o IVA ou outros impostos para o consumidor depende da elasticidade da procura em relação ao preço. Os bens com uma procura inelástica (isto é, em que a procura desce muito pouco quando o preço sobe) são os mais susceptíveis de reflectirem grande parte da subida do imposto no preço. É por isso que o Governo cobra impostos específicos altíssimos nos combustíveis e no tabaco – um aumento destes impostos faz reduzir muito pouco a procura e, logo, aumenta generosamente a receita fiscal. O nível anormalmente alto dos impostos sobre as casas (IMI) e automóveis (na aquisição e circulação) também se deve a isto – as pessoas precisam de uma casa e um carro, em geral, e o governo sabe que pode aumentar estratosfericamente estes impostos sem que se reduza significativamente a procura. ↩︎
- in The Cristopher Parkening Guitar Method, Vol. 2, (1997), p. 119. ↩︎
- Sobre marxismo, mercado e cultura, ver Paul Cantor. ↩︎
- Em 1977, a principal componente da despesa pública era as remunerações pagas aos funcionários e a segunda as prestações sociais. Em 2013 esta ordem inverteu-se. ↩︎
- Ver Bastiat (1850). Economic Harmonies. Capítulo 17: “Serviços Públicos e Privados”. ↩︎
- Ver Ayn Rand, “Government Financing in a Free Society”. ↩︎
Nota: artigo escrito originalmente em 2014, com algumas adaptações para 2024.