A maioria das pessoas aceita as proibições morais de mentir, matar e roubar nas suas vidas pessoais assim como nos seus negócios. Porque é que, então, o governo — sendo ele também feito de pessoas — tem direito a um tratamento especial? Será a ética irrelevante nos assuntos governamentais?
A resposta é sim, porque não há ninguém para responsabilizar o governo. Pela sua natureza como estado, está acima da responsabilidade. Como Rothbard explicou de forma elaborada, o estado é um bando criminoso em grande escala, uma organização não sujeita às suas leis por causa do seu monopólio da violência. A noção de Jefferson de amarrar os homens com as cadeias da Constituição foi facilmente quebrada pela intriga governamental.
Por vezes a culpa pela ausência de moral governamental é atribuída a uma perda de fé religiosa entre os cidadãos e aqueles que eles elegem. Mas um estudo Pew Research Religious Landscape Study (RLS), conduzido em 2007, 2014 e 2023-24, revelou que uma esmagadora maioria de cristãos e não cristãos consideram o roubo, o homicídio e a mentira como violações de uma vida honesta. Podem ter perdido a fé num poder superior, mas as suas morais professadas mantiveram-se inabaláveis.
Se ninguém punisse uma pessoa por roubar, ela poderia sentir-se tentada a tentar. Mas, talvez devido a uma consciência persistente, a maioria das pessoas sentiria ainda a necessidade de justificar o roubo. Como a maioria dos credos éticos censura acções tomadas em interesse próprio ao mesmo tempo que louva acções tomadas em prol de outros, um ladrão pode banhar-se em luz ética se conseguir mostrar que agiu por alguém que não ele próprio. Levado a sério, o governo torna-se um estado-providência.
O estado americano — fundado de forma inconsistente sobre o laissez-faire — tornou-se mais rico do que outros governos porque presidiu a uma economia que foi autorizada a florescer a níveis históricos, mas depois levou a cabo um golpe em 1913 com a aprovação da 16.ª emenda e da Lei da Reserva Federal, cada uma sendo uma expansão de poder que facilitava o roubo. O imposto sobre o rendimento tinha a “virtude” de “atingir os ricos”, o que fez inicialmente com a Lei da Receita de Guerra de 1917, mas mais tarde — em combinação com a política monetária confiscatória da Reserva Federal — levou ao declínio da classe média e a um governo aparentemente omnipresente.
Woodrow Wilson — o residente da Casa Branca durante o golpe de 1913 — expressou pensamentos sombrios sobre o que tinha feito na sua colecção de discursos de campanha, The New Freedom:
“Restringimos o crédito, restringimos a oportunidade, controlámos o desenvolvimento, e passámos a ser um dos governos mais mal governados, um dos mais completamente controlados e dominados, no mundo civilizado — já não um governo por opinião livre, já não um governo por convicção e pelo voto da maioria, mas um governo pela opinião e pela coacção de pequenos grupos de homens dominantes.”
Certos grupos pequenos mas controladores esmagaram os últimos vestígios de um sistema monetário relativamente sólido usando a crise económica dos anos 30 como desculpa, depois, através de actividades nos bastidores, tornaram-se combatentes noutra guerra estrangeira, após as repetidas mentiras do presidente sobre não nos meter nela. Milhões de mortes e biliões em destruição mais tarde, o governo ampliou os seus modos intervencionistas quando ele assinou a Lei de Segurança Nacional de 1947. Desde então, o governo encontrou ameaças em todo o lado onde olhou, incluindo Cuba, América do Sul, Coreia, China, Vietname, Médio Oriente, e sempre, a Rússia. Após o 11 de Setembro, o seu foco intensificou-se sobre o próprio povo que o apoia involuntariamente, aqui dentro de casa, com o argumento de que os terroristas poderiam estar em qualquer lado.
Que outro país tem “750 bases militares ‘locais’ estimadas em cerca de 80 países e colónias/territórios estrangeiros”? Talvez o mundo não parecesse tão ameaçador se o deixássemos em paz. Os EUA tornaram-se assim um estado de guerra romano, com orçamentos de inteligência e militares intocáveis.
Hans-Hermann Hoppe, no seu ensaio The Libertarian Quest for a Grand Historical Narrative, aponta as contradições flagrantes entre a ética pessoal da maioria das pessoas e a “ética” que define o governo. Relativamente aos Dez Mandamentos, escreve:
“Neste ponto, os mandamentos bíblicos vão mais além do que muitos libertários consideram suficiente para o estabelecimento de uma ordem social pacífica: a mera adesão estrita aos mandamentos seis, oito e dez. Ainda assim, esta diferença entre um libertarianismo estrito e rígido e os dez mandamentos bíblicos não implica qualquer incompatibilidade entre ambos. Estão em plena harmonia se apenas se fizer uma distinção entre proibições legais, por um lado, expressas nos mandamentos seis, oito e dez, cujas violações podem ser punidas pelo exercício da violência física, e proibições extralegais ou morais, por outro lado, expressas nos mandamentos cinco, sete e nove, cujas violações só podem ser punidas por meios abaixo do limiar da violência física, como a desaprovação social, a discriminação, a exclusão ou o ostracismo.”
Ele conclui: “Mesmo com as maiores contorções intelectuais é impossível derivar a instituição de um estado a partir destes mandamentos.”
No entanto, os altos dignitários do estado prestam falso testemunho a cada hora do dia, com impunidade. Como testemunhámos durante o episódio do covid, grandes doadores políticos também escaparam à responsabilidade pelos seus actos hediondos. Incluídas no pesadelo do covid estavam prestigiadas instituições médicas — cheias de dinheiro governamental — a promover informações falsas sobre a hidroxicloroquina, que continuam hoje como autoridades médicas desavergonhadas. Para parafrasear Thomas Paine, a liberdade foi caçada em todo o país assim como no resto do mundo. O que impede os governos de tentarem um Covid II?
Os direitos inalienáveis de todos os homens que Jefferson estabeleceu na Declaração precisam de um forte campeão para os defender, e sugiro que tome a sua forma num mercado livre competitivo onde a segurança é comprada juntamente com outros bens. Governar por força monopolista é incompatível com o bem-estar humano.
Artigo publicado originalmente no Mises Institute.