A tese central de Mises e Hayek é simples mas devastadora: a centralização da economia conduz inevitavelmente à sua destruição. Sempre que o poder político tenta assumir o papel de “planeador central”, substituindo as escolhas livres das pessoas por ordens emitidas de um gabinete em S. Bento, acaba por distorcer os sinais que orientam a cooperação social e cria consequências desastrosas. A economia não é uma máquina que se regula de cima; é um processo vivo e descentralizado, feito do dia-a-dia em que milhões de indivíduos compram e vendem, trabalham, poupam, investem e inovam. É essa rede complexa de decisões locais, guiada pelos preços e pelas preferências, que nenhum político ou técnico pode reproduzir. A arrogância fatal está em acreditar que um pequeno grupo pode substituir esta ordem espontânea por decretos e planos centralizados.
Em Portugal, porém, persiste uma mentalidade de dependência, quase infantil, do “pai-estado” que tem o dever de prover e regular tudo o que importa. É a ilusão de que mais intervenção política é sinónimo de “salvação do povo”. Sempre que há uma crise, a primeira resposta da população é exigir mais centralização, mais subsídios, mais controlo. No entanto, a história recente mostra exactamente que é essa centralização que perpetua os problemas.
Lembremo-nos de alguns exemplos:
• Banca e sector financeiro: Depois do colapso do BES em 2014, a resposta não foi permitir que a falência responsabilizasse os gestores e accionistas, como seria natural num sistema de mercado. O estado entrou em cena e socializou os prejuízos através do Novo Banco e do Fundo de Resolução. Na prática, fez com que os cidadãos e contribuintes pagassem pelos erros de banqueiros e políticos e o resultado foi um sector bancário ainda mais dependente da política, com incentivos distorcidos e confiança corroída.
• TAP: Repetidamente resgatada com dinheiro público, a companhia aérea tornou-se um símbolo do vício português na intervenção estatal. Sempre que ameaça cair, justifica-se o “salvamento” com argumentos patrióticos: bandeira, diáspora, “estratégico”, etc. Na realidade, os resgates custaram milhares de milhões aos contribuintes, sem resolver a sua inviabilidade estrutural. É a encarnação da tese de Mises: tentar sustentar artificialmente uma empresa falida é desviar recursos daquilo que os portugueses realmente valorizam e estão dispostos a pagar.
• Sector da energia: A obsessão com “planos estratégicos” levou à criação de rendas garantidas e monopólios de facto. Os consumidores pagam facturas carregadas de encargos escondidos para sustentar políticas ditas verdes ou de “segurança energética”. Em vez de abrir o mercado à concorrência, perpetua-se um cartel legalizado (EDP, Galp, REN, Iberdrola e Endesa). O estado centraliza, distorce os preços e impõe sobrecustos na factura do cidadão comum. O apagão de 2025 revelou que apesar de décadas de “planos estratégicos” e subsídios, bastou uma falha técnica para deixar milhões sem energia. A centralização não trouxe resiliência, trouxe fragilidade.
• Educação: As constantes “reformas estruturais” vindas de Lisboa, desde a reorganização curricular às provas nacionais, mostram o mesmo padrão: a crença de que uns quantos técnicos podem planear a aprendizagem de milhões de alunos. O resultado é a mediocridade sistemática, a fuga de talentos e a reprodução de desigualdades. O que seria natural (diversidade de métodos, autonomia de escolas, liberdade de escolha dos pais) é bloqueado por uma lógica de centralização.
Estes exemplos revelam uma incoerência profunda na mentalidade nacional: diante da evidência repetida de que a intervenção centralizada gera ineficiência, desperdício e corrupção, a resposta popular é quase sempre pedir “ainda mais estado”. É como tentar curar uma intoxicação alcoólica com doses adicionais de shots de tequila.
Mises e Hayek há muito que diagnosticaram esta patologia: quando o planeamento central falha, os políticos não concluem que o problema é o planeamento, mas que ainda não foi suficientemente centralizado. Em Portugal, esta lógica tornou-se um vício cultural. Enquanto persistirmos na ilusão de que o estado pode “salvar o povo”, continuaremos a caminhar em direcção ao colapso económico lento, não por falta de talento ou de recursos, mas por insistirmos em negar a ordem espontânea do mercado.
O verdadeiro caminho de emancipação não está em exigir mais centralização, mas em confiar mais na liberdade. A verdadeira prosperidade só aparece quando o estado se afasta e o povo pode viver, arriscar e criar.