Como seria a sociologia se os seus praticantes levassem a sério Mises, Hayek e Rothbard?
Em «Toward an Austro-Libertarian Sociology» (Rumo a uma sociologia austro-libertária), publicado recentemente no American Journal of Economics and Sociology (Março de 2025), estabeleço as bases para uma alternativa à ortodoxia sociológica predominante — uma alternativa que rejeita os pressupostos colectivistas e recentra a acção humana, a cooperação voluntária e a ordem espontânea.
No mundo actual, a intervenção estatal não é apenas uma escolha política — é a configuração padrão da vida moderna. De subsídios e regulamentações a programas de assistência social e censura, a interferência do governo molda tudo, desde a nossa actividade económica até o nosso comportamento diário. No entanto, apesar dessa omnipresença, uma disciplina tem-se mantido estranhamente silenciosa sobre o assunto: a sociologia.
A sociologia dominante há muito que abraçou pressupostos colectivistas, muitas vezes retratando o Estado como uma força benevolente e o capitalismo como um problema a ser resolvido. Embora isso possa ter parecido inofensivo no passado, hoje impede a nossa capacidade de compreender — e desafiar — os sistemas coercitivos que dominam as nossas vidas. Em resposta, proponho um novo quadro: Sociologia Austro-Libertária.
Enraizada na Escola Austríaca de Economia e no pensamento liberal clássico, esta abordagem sociológica centra-se na acção individual, na cooperação voluntária e na ordem espontânea que emerge quando as pessoas são livres. Inspira-se em pensadores como Ludwig von Mises, Friedrich Hayek, Murray Rothbard e Hans-Hermann Hoppe, mas também em sociólogos como Max Weber, Alexis de Tocqueville e Raymond Boudon, que enfatizaram a importância da responsabilidade pessoal, da sociedade civil e do individualismo metodológico.
Este artigo descreve o núcleo deste campo emergente: os seus princípios, métodos e por que é mais importante hoje do que nunca.
O Ponto Cego da Sociologia Contemporânea
A sociologia — outrora uma ferramenta poderosa para compreender a experiência humana — foi sequestrada por narrativas estatistas e colectivistas. Da disseminação de ideologias «woke» à normalização da burocracia e da cultura da vitimização, a disciplina abandonou em grande parte a sua função crítica. Em muitas instituições académicas, questionar o papel do estado é tabu.
Mas, à medida que cresce a frustração pública com a interferência excessiva do governo — desde protestos contra o lockdown e revoltas fiscais, até a ascensão de figuras políticas outsiders como Javier Milei —, fica claro que precisamos de uma maneira melhor de analisar como as sociedades reagem à coerção estatal.
Onde está o quadro sociológico que explica como as pessoas resistem, se adaptam ou contornam o poder estatal? Onde estão os sociólogos que estudam a cooperação espontânea, a desobediência civil ou a ascensão de instituições paralelas? É aqui que entra a Sociologia Austro-Libertária.
A Acção Humana como Fundamento
Na sua essência, a Sociologia Austro-Libertária assenta numa ideia poderosa: os indivíduos agem. Isto pode parecer óbvio, mas na sociologia dominante é uma afirmação radical. Muitas teorias predominantes vêem as pessoas como produtos passivos de estruturas — raça, classe, género, ideologia — em vez de agentes intencionais capazes de escolha, criatividade e resistência.
Com base na praxeologia de Mises, esta abordagem vê os seres humanos não como marionetas do sistema, mas como actores que fazem escolhas com base em valores subjectivos. Estas escolhas, quando agregadas, formam instituições, normas e ordens sociais — e não o contrário. Em vez de tratar a «sociedade» como uma máquina gigante ou um organismo moral, a Sociologia Austro-Libertária vê-a como a soma de inúmeras interacções individuais, evoluindo ao longo do tempo através da tentativa, erro e adaptação.
Cinco Campos de Investigação
Para tornar esta abordagem operacional, proponho concentrar-nos em cinco domínios-chave — cada um correspondendo a um valor austríaco/libertário fundamental:
- Sociologia da Acção Humana: Como é que os indivíduos navegam em ambientes coercivos? Como inovam, resistem ou cooperam quando confrontados com restrições burocráticas ou ideológicas?
- Sociologia do Capitalismo de Mercado Livre: Como é que o capitalismo é representado na educação, nos meios de comunicação social e na lei? É visto como uma fonte de empoderamento ou como um bode expiatório para todos os problemas sociais?
- Sociologia dos Direitos de Propriedade: Como é que diferentes sociedades enquadram a propriedade, o empreendedorismo e a criação de riqueza? O que acontece quando os direitos de propriedade são ignorados ou politizados?
- Sociologia da liberdade contratual: até que ponto os indivíduos são livres para celebrar acordos sem interferência do Estado? Como os contratos são protegidos — ou prejudicados — pelas instituições actuais?
- Sociologia da concorrência natural: como as pessoas percebem a concorrência? Ela é demonizada como implacável ou entendida como um motor de inovação, descentralização e prosperidade?
Esses cinco domínios fornecem um roteiro para compreender o impacto social do intervencionismo — e a força oculta das ordens descentralizadas.
Doze Novos Conceitos para o Século XXI
Para ajudar a analisar como as pessoas se adaptam ou resistem à coerção, desenvolvi doze conceitos que capturam padrões-chave da vida moderna:
- Síndrome de Dependência do Estado (SDS): Uma mentalidade em que as pessoas procuram reflexivamente o governo para obter soluções, perdendo a fé na sua própria iniciativa ou nas soluções de mercado.
- Agência adaptativa: as formas criativas como os indivíduos se adaptam a sistemas coercitivos — como mudar para o estrangeiro, mudar para o ensino doméstico ou usar criptomoedas para contornar controlos financeiros.
- Equilíbrio coercitivo: um status quo social em que todos aceitam o controlo estatal como normal — até mesmo desejável.
- Redes de resistência espontânea: grupos informais e instituições paralelas que surgem em resposta à interferência excessiva do Estado (por exemplo, mercados negros, escolas alternativas, redes de ajuda mútua).
- Fadiga regulatória: O esgotamento causado pela regulamentação constante, levando ao desinteresse ou à apatia.
- Subversão cooperativa: Quando as pessoas unem forças para subverter ou contornar regras de forma pacífica e produtiva (por exemplo, DeFi, projectos de open source).
- Capitalismo de vigilância intervencionista: A fusão do poder estatal e dos monopólios digitais para controlar, prever e manipular o comportamento individual.
- Engenharia linguística estatal: A manipulação da linguagem pelo Estado para remodelar a realidade (por exemplo, mandatos de discurso inclusivo, unidades de combate à desinformação).
- Procura programada pela educação: procura artificial por ideias, serviços ou profissões patrocinados pelo Estado, criada pela educação pública.
- Estratégia de associação pública perigosa: uma táctica em que os dissidentes são rotulados como perigosos para deslegitimá-los (por exemplo, «anticientífico», «extremista», «teórico da conspiração»).
- Colectivismo em câmara lenta: A expansão gradual do Estado por meio de crises, regulamentações e engenharia cultural — sem nunca chamá-la de “colectivismo”.
- Divisões planeadas: O uso político da identidade e do conflito entre grupos para dividir a população e impedir a resistência unificada.
Esses conceitos ajudam a explicar não apenas o que o Estado faz, mas também como as pessoas respondem.
Métodos Empíricos de Investigação no Mundo Real
A sociologia austro-libertária não é apenas teórica — também é empírica. Incentiva os investigadores a usar métodos qualitativos (entrevistas, etnografias, estudos de caso) para entender como as pessoas constroem alternativas ao poder estatal. Por exemplo:
- Como é que as famílias lidam com a escolaridade obrigatória que consideram inadequada?
- Por que os empreendedores fogem de países com impostos altos — e como se reconstroem no exterior?
- O que motiva as pessoas a aderir a economias clandestinas ou comunidades criptográficas?
Também apoia métodos quantitativos quando apropriado: acompanhar o aumento do ensino doméstico, a disseminação dos mercados negros ou as mudanças da confiança pública nas instituições governamentais. O objectivo não é copiar a obsessão da sociologia dominante pelos dados, mas usar evidências do mundo real para enriquecer a nossa compreensão de como a liberdade sobrevive — e, às vezes, prospera — apesar do controlo estatal.
Rumo a uma Sociologia da Liberdade
Por que é que isto é importante?
Hoje, as nossas sociedades estão a passar por uma transformação silenciosa. Crises como a COVID-19 normalizaram poderes governamentais extraordinários; a vigilância tornou-se rotina; a linguagem da liberdade foi substituída pela linguagem da “segurança”, “inclusão” e “equidade” — termos frequentemente cooptados pelo Estado para justificar a sua expansão. Entretanto, a sociologia dominante oferece pouca resistência. Pelo contrário, muitas vezes age como animadora do Estado — reembalando o planeamento central como «justiça» e o controlo burocrático como «cuidado».
A Sociologia Austro-Libertária procura mudar isso. Apela para uma nova geração de académicos, investigadores e pensadores dispostos a revisitar velhos pressupostos, desafiar o pensamento ideológico colectivo e restaurar o indivíduo — agindo, adaptando-se e cooperando livremente — ao centro das ciências sociais.
Mas não se trata apenas de investigação. Trata-se de cultura. A sociologia continua a ser uma das disciplinas mais populares, controversas e culturalmente influentes nas ciências humanas e sociais. Molda a forma como as gerações pensam sobre poder, liberdade, justiça e sociedade. Se a abandonarmos aos dogmas colectivistas, perderemos a narrativa. Se a recuperarmos, abriremos uma nova frente na batalha das ideias. Não se trata apenas de compreender a sociedade. Trata-se de recuperá-la.
Artigo publicado originalmente no Mises Institute.