Em 18 de Maio, na Praça de São Pedro, o novo Papa Leão XIV exortou a Igreja Católica a tornar-se um modelo de «unidade, comunidade e fraternidade no mundo.» Uma tarefa central do seu pontificado será abordar as crises sociais e económicas do nosso tempo. Mas por trás da retórica está uma questão determinante: irá continuar a recente tendência da Igreja para políticas globalistas ou retornará à herança da Igreja de liberdade económica, subsidiariedade e lei natural?
Hoje, a Doutrina Social da Igreja é uma casa dividida. Uma tradição — a tradição liberal-subsidiária, liderada pelo Papa Leão XIII — baseia-se na lei natural, na liberdade individual e num cepticismo saudável em relação ao poder do Estado. A outra — a tradição globalista-solidária, com o apoio do Papa São João Paulo II e do falecido Papa Francisco — enfatiza a coordenação internacional, a governança regulatória e uma profunda desconfiança em relação ao livre mercado.
Nas últimas décadas, esta última passou a dominar o discurso da Igreja. No entanto, este domínio tem um custo. A abordagem globalista-solidária recorre ao planeamento central para alcançar resultados que só os mercados descentralizados podem proporcionar. Ao fazê-lo, apoia políticas economicamente insustentáveis e contraproducentes. Se o Papa Leão XIV quer realmente enfrentar os problemas sociais e económicos, deve reanimar a tradição liberal-subsidiária.
O Legado Liberal de Leão XIII
A tradição liberal-subsidiária está enraizada na herança intelectual da Igreja. Embora a Igreja Católica se envolva há muito tempo com questões sociais, a Doutrina Social da Igreja foi formalmente definida em 1891 com a encíclica Rerum Novarum de Leão XIII — amplamente considerada o documento fundador da Doutrina Social moderna e um importante ponto de referência para a tradição liberal católica.
Na Rerum Novarum, Leão XIII defende a propriedade privada como um direito natural «comprovadamente pertencente às pessoas individuais». Enfatiza que a propriedade não é apenas justa, mas necessária para o florescimento humano, a protecção da família e o funcionamento do comércio. Longe de tratar a liberdade económica como uma ameaça à justiça, Leão vê-la como uma condição prévia para a ordem social.
A encíclica também limita o papel do Estado. Defende a subsidiariedade — o princípio de que as questões devem ser tratadas pela autoridade competente menor, mais baixa e menos centralizada. Leão ensina que a família «deve necessariamente ter direitos e deveres próprios, que são totalmente independentes do Estado». Os indivíduos e as famílias vêm antes do Estado; eles não são suas criaturas, mas sua fundação.
Além disso, Leão afirma a ordem espontânea. Embora reconheça que os conflitos laborais inevitavelmente surgirão, ele não apela a uma intervenção estatal pesada. Em vez disso, confia a organismos intermediários — como a Igreja, os sindicatos e as associações voluntárias — a tarefa de resolver os conflitos. O Estado é o último recurso para a justiça.
Murray Rothbard chamou a Rerum Novarum de «fundamentalmente libertária e pró-capitalista», porque defende as instituições — a propriedade privada e o Estado de direito — das quais depende uma economia livre. Leão XIII não era economista, mas foi profundamente influenciado por pensadores como Luigi Taparelli e Wilhelm Emmanuel von Ketteler, que eram versados em política e pensamento liberal. Através deles, Leão envolveu-se com a tradição liberal clássica.
Da Liberdade ao Planeamento Central
Nos últimos 130 anos, a Igreja afastou-se gradualmente das ideias económicas da Rerum Novarum. Hoje, grande parte da Doutrina Social da Igreja favorece o intervencionismo, a supervisão regulatória e o planeamento central — muitas vezes rejeitando a priori os argumentos do liberalismo clássico. Ao mesmo tempo, os líderes da Igreja rejeitam, com razão, os horrores do socialismo. Mas a tradição globalista-solidária tornou-se economicamente incoerente, perseguindo objectivos morais através de meios incompatíveis com uma economia sólida e, em última análise, autodestrutivos.
Ao contrário de Leão XIII, os papas recentes afastaram-se em grande parte da lógica dos mercados. Rothbard atribui esta mudança ao Papa Pio XI, em 1931. Na Laudato Si’, por exemplo, o Papa Francisco afirma que “o ambiente é um dos bens que não podem ser adequadamente salvaguardados ou promovidos pelas forças do mercado”. Ele refere-se de forma desdenhosa à ideia de que a ordem pode emergir da acção voluntária, chamando-a de “pensamento mágico”. Em vez de se envolver com a ciência da acção humana, Francisco retrata o mercado como um fracasso moral — uma visão mais enraizada na abstracção do que na análise.
Este desligamento tem consequências. Em Laborem Exercens, o Papa São João Paulo II recomenda a «socialização» das indústrias que não satisfazem as necessidades sociais. Implícita nesta afirmação está uma suposição de planeamento: que uma autoridade central pode saber como é uma distribuição justa dos recursos e como implementá-la. Mas isto ignora a visão austríaca de que nenhum planeador possui o conhecimento disperso necessário para coordenar milhões de preferências individuais. O planeamento central, por mais moral que seja a sua intenção, está destinado ao fracasso económico — e, eventualmente, político.
O Papa Francisco estende a lógica de João Paulo II ao nível global. No capítulo 5 de Laudato Si’, apela a reguladores supranacionais com poderes para eliminar os combustíveis fósseis e redistribuir a riqueza em todo o mundo de forma a combater as alterações climáticas. Estas propostas pressupõem não só a viabilidade económica, mas também a autoridade moral à escala planetária, levantando sérias preocupações sobre a subsidiariedade, a responsabilidade e a liberdade.
Para ser claro, nem João Paulo II nem Francisco endossaram explicitamente o socialismo. Mas, ao concentrar o poder em agências centralizadas, ambos correm o risco de possibilitar o sistema que condenam. As suas encíclicas traçam uma visão económica sombria — que, apesar das suas intenções morais, prioriza a redistribuição em detrimento do crescimento e a regulamentação em detrimento da inovação. Essa perspectiva decorre de um desejo sincero de defender a justiça e cuidar dos vulneráveis, mas corre o risco de abraçar políticas que inadvertidamente restringem a prosperidade e a cooperação. O livre comércio, baseado no benefício mútuo, continua a ser um poderoso motor da dignidade humana e da solidariedade.
Restaurar a Tradição Liberal-Católica
Na sua forma actual, a Doutrina Social da Igreja Católica — sob o domínio da tradição globalista-solidária — não pode fornecer o modelo de «unidade, comunidade e fraternidade» que o Papa Leão XIV idealizou. Em vez disso, a sua adesão à centralização corre o risco de dividir ainda mais o mundo e enfraquecer o testemunho social da Igreja.
No entanto, há motivos para esperança. Ao escolher o nome Leão, o novo papa sinalizou o desejo de seguir os passos de Leão XIII, o arquitecto da Rerum Novarum. Para honrar esse legado e enfrentar as crises socioeconómicas do nosso tempo, o Papa Leão XIV deve retornar aos seus princípios: subsidiariedade, propriedade privada, associação voluntária e liberdade. Só assim a Igreja poderá voltar a ser o que o mundo tanto precisa: uma voz moral fundamentada na verdade da acção humana e defensora da liberdade e da dignidade humanas.
Artigo publicado originalmente no Mises Institute.